Ansioso, atribulado e desesperado telefonema de despedida de uma mulher abandonada pelo amante, A Voz Humana é um monólogo traiçoeiramente simples e prosaico. Apupada na estreia, em 1930, a peça de Jean Cocteau acabou inevitavelmente por encontrar a sua fortuna, ao ser interpretada por atrizes como Ingrid Bergman, Liv Ullmann e Simone Signoret, e ao tornar-se, por exemplo, o núcleo sensível de A Lei do Desejo de Pedro Almodôvar. Parece agora ter chegado o momento de Emília Silvestre assumir, entre nós, esta mulher que fala ao telefone com um amante invisível – e inaudível. Esta peça sobe ao palco do Cine-Teatro de Estarreja já este sábado envie um email para terranova@terranova.pt (com passatempo identificado, nome completo e n.º B.I) e seja um dos premiados.
Este é um novo teste ao excecional domínio vocal, ao apurado sentido de composição e à desenvolta plasticidade da atriz fundadora do Ensemble, depois dos fulgurantes monólogos e solos que foram pontuando a sua carreira – do tour de force pessoano da Carta da Corcunda para o Serralheiro de Turismo Infinito e Sombras à demasiado humana Eu Não, de Samuel Beckett, ou a esse repositório de dor de Dama d’Água, de Frank McGuinness. Mas nesta Voz Humana também Carlos Pimenta – acompanhado por Raquel Castro, realizadora do filme-ensaio Soundwalkers – propõe uma evasão do naturalismo que informa o texto de Cocteau, ensaiando um novo investimento audiovisual e colocando em tensão os 80 anos volvidos sobre a escrita deste monólogo em que a tecnologia – o telefone – detém um papel central.